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A Radioterapia Encefálica é necessária quando realizado Inibidor de Tirosina-Kinase em pacientes com tumor de pulmão com alteração EGFR/ALK e metástase em SNC?

A análise do perfil molecular para vários tipos de tumores apresenta-se como excelente ferramenta para a definição do melhor tratamento, tornando-o mais preciso e consequentemente mais efetivo. Para o tratamento do câncer de pulmão, o melhor conhecimento da biologia molecular e dos marcadores tumorais permitem o uso de drogas-alvos preditoras de reposta, como os inibidores de tirosina quinase (TK), tanto em tumores localmente avançado e metastáticos.

Estudos prévios demonstraram a penetrância dos inibidores de TK na barreira hematoencefálica e resposta intracerebral em metástases, principalmente com inibidores de TK de gerações mais modernas, quais apresentaram melhores desfechos em sobrevida quando comparado aos inibidores de TK de primeira geração. Tais estudos associavam a irradiação cerebral em conjunto com o tratamento sistêmico. Por isso, a efetividade da resposta intracraniana quando realizado inibidores de TK mais modernas sem associar a radioterapia encefálica é incerta.

Dessa forma, três instituições acadêmicas americanas (Universidade do Colorado, Universidade de Stanford e Universidade da Califórnia – São Francisco) realizaram um coorte retrospectiva com objetivo de comparar desfechos intracranianos e globais para paciente com tumor de Pulmão não-pequenas Células que apresentavam metástases encefálicas, tais paciente deveriam apresentar mutação do gene EGFR e/ou rearranjo do gene ALK e apresentarem proposta de iniciar inibidores de TK com penetração encefálica, de forma isolada ou em conjunto com Radioterapia encefálica seja radiocirurgia ou Radioterapia de todo o encéfalo.

Um total de 147 pacientes foram incluídos na análise. Desses, 84 pacientes realizaram inibidor de TK isoladamente, enquanto 63 realizaram Radioterapia encefálica em conjunto com o inibidor de TK. Em relação a Radioterapia, 80% realizaram radiocirurgia, 20% Crânio Total. Com intuito de análise, para paciente com mutação do gene EGFR, realizou-se Osimertinibe (95% dos pacientes) ou Rociletinibe. Já para pacientes com rearranjo do gene ALK, realizou-se Alectinibe (80% dos pacientes), Brigatinibe, Lorlatinibe ou Ensartinib. E para aqueles pacientes que realizaram Radioterapia, o tratamento foi realizado dentro de 8 semanas do início do inibidor de TK.

A avaliação de desfechos foi realizada separadamente em relação a mutação EGFR ou rearranjo ALK. Com follow-up mediano de 16.8 meses para pacientes com mutação EGFR e 27.8 meses para pacientes com rearranjo do ALK.

Os desfechos clínicos foram semelhantes entre os dois braços. Ou seja, não houve diferença estatística quando realizada comparação de pacientes recebendo inibidor de TK isolado ou em associação com radioterapia encefálica, tanto em pacientes com mutação do gene EGFR ou com rearranjo do gene ALK.
Para pacientes EGFR mutado, o tempo mediano para progressão intracraniana foi de 14.8 meses nos pacientes que realizaram inibidor de TK isolado, versus 20.5 meses com a adição de radioterapia encefálica(p=0.51). O tempo mediano para qualquer progressão foi de 8.5 meses versus 6.9 meses em pacientes que realizaram inibidor de TK isolado ou com radioterapia associada (p=0.13), respectivamente.

Semelhantemente, pacientes com rearranjo do gene ALK apresentaram tempo mediano para progressão intracraniana de 18.1 meses versus 21.8 meses quando realizaram inibidor de TK isolado ou associado a radioterapia (p=0.65), respectivamente. E tempo mediano para qualquer progressão de 11.4 meses para pacientes no braço inibidor de TK isolado versus 13.4 meses para pacientes que utilizaram inibidor de TK + Radioterapia encefálica. (p=0.98).
Apesar de maior tempo com controle intracraniano nos pacientes que receberam Radioterapia encefálica, não houve significância estatística na comparação.

Uma subanálise com pacientes que realizaram inibidor de TK como primeira linha de tratamento sistêmico foi realizada e da mesma forma sem diferença de desfecho clínico entre os grupos, incluindo Sobrevida Global, com tempo mediano de sobrevida não alcançado nos dois grupos que realizaram inibidor de TK isolado ou no grupo inibidor de TK associado a Radioterapia em pacientes com rearranjo ALK. Sobrevida mediana de 44 meses em pacientes EGFR mutado submetidos a inibidor de TK com Radioterapia encefálica.

A maioria das características dos pacientes não apresentou diferença estatística, porém cabe ressaltar alguns pontos relacionados ao número e ao volume de doença intracerebral. No grupo com mutação EGFR, os pacientes submetidos a inibidor de TK isolado apresentavam menos lesões metastáticas em sistema nervoso central comparado ao grupo que foi submetido a radioterapia em conjunto com inibidor de TK (p=0.173). O inverso aconteceu no grupo com rearranjo de ALK, apresentando menos lesões encefálicas o grupo submetido a inibidor de TK + Radioterapia (p=0.143). Semelhantemente, o tamanho das lesões encefálicas era de menores em ambos os grupos submetidos a inibidor de TK isoladamente, sem diferença estatística quando comparado ao grupo submetido a Radioterapia nos pacientes com rearranjo de ALK(p=0.078), mas com diferença nos pacientes com mutação EGFR (p=0.027). Assim como, 50% dos pacientes submetidos a irradiação cerebral no grupo de pacientes EGFR mutado apresentavam sintomas neurológicos, versus 12% dos pacientes submetidos a inibidor de TK isolado (p=0.001).

Em análise multivariada, o fato de o paciente ter sido submetido a qualquer tratamento sistêmico prévio resulta em maior risco para progressão intracraniana(p=0.008), qualquer progressão(p=0.015) e tempo para falha ao tratamento(p=0.027) no grupo de pacientes com mutação do EGFR, sugerindo tratar-se de uma doença mais resistente e avançada.

Além do desenho retrospectivo, a presença de mais pacientes no grupo radioterapia com critérios clínicos como doença sintomática, o uso de corticoide assim como maiores lesões, permite a crítica pontual desse estudo e reafirma a importância do papel da Radioterapia nesses pacientes. Tal estudo reforça a necessidade de novas investigações, mais robustas. Em fase de recrutamento, o Trial OUTRUN (Fase 2 comparando Osimertinibe com ou sem rádiocirurgia para lesões encefálicas) é aguardado.

Os resultados desse estudo podem ajudar a guiar decisões terapêuticas em reuniões multidisciplinares, corroborando com recomendações do Guideline da ASTRO para tratamento de metástases encefálicas, qual permite que pacientes assintomáticos elegíveis para tratamento sistêmico eficazes no encéfalo, a irradiação cerebral pode ser postergada após decisão multidisciplinar principalmente considerando características das metástases como tamanho, localização, quantidade de lesões, probabilidade de resposta a terapia sistêmica específica, acesso a vigilância neuro-oncológica e disponibilidade de terapia de resgate.

O artigo está disponível no link abaixo:
https://www.jto.org/article/S1556-0864(21)02401-1/fulltext


Tharcísio Coelho

Médico Radio-oncologista da Oncoclinicas RJ

 

 

ECR

RT 2030