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Hipofracionamento Moderado na Radioterapia de Resgate (Hipo-Srt) nos Pacientes com Recidiva Bioquímica após Prostatectomia: Estudo de coorte com Meta-Análise

Após prostatectomia radical (PR), pacientes com câncer de próstata com fatores patológicos desfavoráveis podem se beneficiar de radioterapia (RT) adjuvante. Contudo, há um extenso debate sobre qual melhor momento para realizar esta RT pós-operatória nestes pacientes de alto risco. Três grandes estudos randomizados (GETUG-17, RAVES e RADICALS) e uma metanálise (ARTISTIC) sugerem que RT de resgate precoce provê benefício similar no controle tumoral, com menor toxicidade, quando comparado a RT adjuvante imediata, limitando a adjuvância imediata aos pacientes com risco muito alto risco de recorrência.

Nos últimos anos, diversos estudos randomizados avaliaram esquemas de hipofracionamento moderado (HYPO-RT) em situação de câncer com próstata presente. A grande maioria destes confirmou que HYPO-RT não é inferior ao fracionamento convencional (1,8 a 2Gy por dia) no controle bioquímico e toxicidade. Estes esquemas de hipofracionamento reduzem quase a metade do número de sessões de RT, sendo muito atraente aos pacientes e instituições responsáveis. Mesmo com estas vantagens já descritas, a experiência clínica com HYPO-RT em tratamento de resgate é limitada. Esta presente metanálise avaliou pacientes com recorrência bioquímica (PSA ≥ 0,2ng/ml) tratados por HYPO-RT (2,62Gy por fração com dose total de 52,5Gy) para sumarizar a eficácia e segurança deste esquema de fracionamento. Os objetivos primários foram avaliar sobrevida livre de recorrência bioquímica (SLRB) e sobrevida total (ST), com objetivo secundário de avaliar toxicidade genitourinária (GU) e gastrintestinal (GI) aguda e tardia.

369 pacientes em 05 estudos retrospectivos publicados entre 2004 e 2020 foram apreciados após seguimento médio descrito de 36 meses. A SLRB em 03 anos foi de 73%, com estimativa para 05 anos de 61%. Uso de bloqueio androgênico, PSA residual, Gleason ≥ 8 e margens comprometidas foram estatisticamente significantes. A taxa de toxicidade tardia ≥ 2 em GU foi de 6% e 3% em GI. Nenhum caso de toxicidade aguda ou tardia de grau 3 a 5 foi observado. O único fator associado a toxicidade GU ≥ 2 foi EQD2Gy ≥ 70Gy. Todas estas taxas descritas foram equivalentes àquelas observadas em estudos usando fracionamento convencional.

A relação entre o uso de bloqueador androgênico e melhor SLRB carece de ser vista com cuidado e talvez ser considerada como “geradora de hipótese”, tendo em vista a heterogeneidade de seu “timing”, dose e duração entre os estudos aqui apreciados. A associação do score de Gleason ≥ 8, nível do PSA após PR e presença de margens cirúrgicas comprometidas com taxas de SLRB piores também precisam de comprovação. Há forte sugestão de que neoplasias com estas características têm comportamento mais agressivo e que aguardar provável recidiva bioquímica não seja a melhor opção, reforçando o conceito de que estes pacientes de alto risco talvez fossem melhor tratados com RT adjuvante ou estratificados por testes genômicos.

A definição de falência bioquímica após RT configura-se como outra dúvida a ser esclarecida, tendo em vista haver significante variabilidade no ponto de corte do nível de PSA dentre os estudos avaliados. Apesar de usarem critérios diferentes para SLRB, a forma desta classificação resultou em impacto pouco expressivo sobre os resultados de controle bioquímico. Nos estudos que definem falência por PSA nadir + 0,1 em ascensão, a SLRB em 3 anos foi de 93%ꓼ naqueles que definem por uma medição de PSA > 0,4ng/ml, foi de 95,3%ꓼ os que consideram falência como três elevações consecutivas, foi 93%ꓼ enquanto os estudos que consideraram nível de PSA > 0,2ng/ml, a SLRB em 3 anos foi de 89,7%.

A toxicidade aguda foi leve em todos os estudos avaliados, a maioria sendo grau 1 e nenhum caso ≥ grau 3. Porém, quanto à toxicidade tardia, naqueles estudos que aplicaram EQD2Gy > 70Gy, foram significantemente associados com pior toxicidade GU ≥ grau 2. Soma-se o estudo randomizado SAKK 09/10 fase 3, publicado em 2021, que avaliou escalonamento de dose de RT para recidiva após PR, não observou benefício na SLRB, mas, significante incidência de sequela tardia GI ≥ grau 2. Baseado nestas informações, EQD2Gy entre 60 e 68Gy talvez seja considerada mais segura.

A metanálise aqui em apreciação apresenta algumas limitações, ressaltando a heterogeneidade da seleção e resultados inerentes à natureza retrospectiva deles. Apesar deste estudo sugerir que HYPO-RT de resgate em recorrência bioquímica resulta em SLRB adequada (principalmente na ausência de fatores de alto risco e no uso concomitante de bloqueio androgênico), com baixas taxas de toxicidade, ela se presta a ser em estudo “gerador de hipóteses”. Deve contribuir na criação de estudos randomizados tentando explorar diversos aspectos da HYPO-RT, como sua comparação com RT de resgate convencional e o benefício de sua combinação com bloqueio androgênico, seu “timing”, tipo e duração.

 

Dr. Jean Paiva
Rádio-oncologista CEBROM Onco Clínicas e Hospital de Câncer Araújo Jorge em Goiânia

ECR

RT 2030