História, evolução tecnológica, infraestrutura necessária e os desafios da implementação clínica. Todos esses aspectos sobre a protonterapia foram abordados em mesa redonda do XX Congresso da Sociedade Brasileira de Radioterapia, realizado em Belo Horizonte, entre 15 e 18 de agosto. Como palestrantes, Beatriz Bernardi, da Varian Medical System; Mauro A. Ferreira, da Medtech Sales/IBA; Carl Ross, do California Protons Centre; e Márcio Fagundes, do Miami Cancer Institute.
Diferentemente da radioterapia convencional, baseada no uso de fótons, que são partículas de luz, para combater as células do câncer, a protonterapia usa feixes de prótons acelerados, que penetram no organismo do paciente sem causar danos aos tecidos sadios. Isso acontece porque a energia desse fluxo de partículas subatômicas eletricamente carregadas é canalizada para o exato momento e lugar em que prótons cessam de se movimentar. Esse ponto de parada é controlado com precisão e direcionado para o tumor, que recebe uma dose de energia maior do que receberia em uma radioterapia convencional. “Esse efeito de concentração da energia das partículas no ponto de parada é denominado pico de Bragg. Com a protonterapia, os feixes depositam 100% da energia no tumor e na profundidade prescrita, sendo que cada camada recebe diferentes doses de energia, conforme definido no plano de tratamento”, explica Beatriz Bernardi.
Na radioterapia convencional, os raios-x são as partículas de luz mais comumente utilizadas no tratamento do câncer. Apesar de combater as células tumorais, antes de atingirem a região que será tratada, perdem parte da energia em seu trajeto, danificando o DNA de células sadias com que entraram em contato nesse caminho. A protonterapia, nos países onde está disponível, tem se revelado eficiente no tratamento de câncer do sistema nervoso central, pulmão, fígado, próstata, tumores de cabeça e pescoço e sarcomas pélvicos e da coluna vertebral, entre outros.
Beatriz Bernardi lembrou que a história da protonterapia começou em 1946 com os estudos do físico norte-americano Robert Wilson, que indicavam a possibilidade do uso de prótons no tratamento de câncer. Na década de 1950, tratamentos ainda de forma incipiente foram realizados na Europa e Estados Unidos. Os primeiros centros de tratamento com próton voltados à oncologia foram inaugurados no Reino Unido, em 1989, e nos Estados Unidos, em 1990. “Até o final de 2015, mais de 154 mil pacientes oncológicos foram tratados com protonterapia no mundo”, informou Beatriz. No entanto, apenas 1% dos pacientes de radioterapia recebem tratamentos com prótons, sendo que 20% poderiam ser beneficiados com essa técnica.
Ao longo do tempo, a tecnologia utilizada para aplicação de protonterapia evoluiu em relação a equipamento e também aos sistemas de planejamento. “Os algoritmos de cálculos estão cada vez mais precisos. Os equipamentos utilizam imãs de rápido escaneamento para direcionar o feixe de prótons para o alvo e proporcionam maior conformação da dose. Cada campo é tratado camada por camada”, informou Beatriz. O tempo de tratamento, com a evolução, também foi ficando menor: em apenas 15 minutos é possível tratar até três campos. O desenvolvimento caminha para a radiocirurgia e a arcoterapia com prótons.
O investimento na montagem de um centro de tratamento de protonterapia, no entanto, ainda é alto para a maioria dos países, especialmente os mais pobres. Para explorar as possibilidades dessa forma de radioterapia é preciso investir em aceleradores circulares de partículas e em instalações especiais para receber esses equipamentos. Além disso, conforme explica Mauro Ferreira, a instituição vai precisar de uma equipe dedicada de técnicos, administradores e engenheiros do fabricante..
Há projetos desenvolvidos no modelo de múltiplas salas, que podem ocupar área em torno de 2.500 m2, com capacidade de atender cerca de 1.300 pacientes/ano. “Um projeto como esse, da negociação do contrato até a entrega,leva cerca de 48 meses”, informou Ferreira. A tendência atual, no entanto, é investir em projetos de sala única, com área de 400 m2, com capacidade para atender de 300 a 500 pacientes ano. O tempo total desse projeto é de 36 meses e o cliente, caso a demanda justifique, pode dobrar de tamanho com a implantação de mais uma sala. Esse tipo de projeto é modular e expansível”, disse.
Mas a protonterapia ainda é uma tecnologia cara para os países mais pobres e mesmo no lado mais rico do mundo, os investimentos diminuíram. “Em média, historicamente, fechamos 12 contratos/ano para implementação desses centros. Nesse ano, entretanto, foram apenas cinco contratos. Nossa estratégia é expandir para os países emergentes, mas precisa haver financiamento que viabilize o investimento”, ponderou Mauro.
Nos Estados Unidos há 28 centros de tratamento de protonterapia, segundo Carl Ross. “A expansão desses centros foi motivada pelo interesse clínico nesse tipo de tratamento. Na primeira onda foi utilizada dispersão passiva, mas a maioria já migrou para a tecnologia de varredura, mais eficiente e assertiva, além de diminuir a duração de cada sessão”, disse.
Marcio Fagundes destacou a importância do investimento em pesquisa utilizando a protonterapia. “Já sabemos que é essencial reduzir a radiação nos tecidos saudáveis, agora precisamos aprofundar nosso conhecimento sobre como fazer isso da melhor forma possível”, ressaltou. As pesquisas mostram, por exemplo, os benefícios da terapia com prótons em tumores raros, como os cordomas. “São tumores que precisam de altas doses de radiação e os estudos têm revelado bons resultados no tratamento com prótons. Além disso, no caso de pacientes com esse tipo de tumor que tinham recidiva, antes da protonterapia, não tinhamos alternativa para oferecer”, destacou.
De acordo com Márcio, no Miami Cancer Institute, as pesquisas também estão sendo direcionadas para radiologia hipofracionada com prótons. “Em patologias cardíacas, o risco relativo da radioterapia é muito maior, e podemos amenizar muito isso com a protonterapia hipofracionada”, concluiu.